Edgard Carone e a República em Capítulos

Para uma compreensão crítica da História da República Brasileira

A trajetória e a produção intelectual de Edgard Carone (1923–2003) — professor, historiador, bibliófilo e militante — foram homenageadas em 15 de novembro de 2025, no Centro de Estudos do Museu Republicano, com o lançamento do livro Edgard Carone e a República em Capítulos. Organizada por Fabiana Marchetti e Felipe Castilho de Lacerda, a obra reúne textos de intelectuais consagrados, que reafirmam a relevância de Carone no campo acadêmico, e de uma nova geração de pesquisadores, que revisitam temas tradicionais sob novos prismas e exploram aspectos pouco estudados da produção de um intelectual erudito, independente e provocador.

Reconhecido como o historiador da República Brasileira, Carone não se limitou a esse campo. “Um esforço equivalente foi dedicado à história do movimento operário, do marxismo e da esquerda, sobretudo ao longo dos anos 1980”, observa Felipe Castilho de Lacerda. Para ele, a publicação cumpre a função de apresentar a obra do historiador marxista às novas gerações e registrar sua contribuição à historiografia nacional.

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Fabiana Marchetti destaca que o livro resulta das discussões realizadas entre 5 e 11 de setembro de 2023, durante o centenário de nascimento de Carone, promovido pelo Programa de História Econômica da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP. A comemoração, sediada na Cidade Universitária e no Museu Republicano, envolveu universidades, museus, arquivos e centros de pesquisa, ampliando a visibilidade do Centro de Estudos do Museu Republicano, que abriga a Biblioteca Edgard Carone — fonte de muitos dos estudos reunidos na obra.

No lançamento de Edgard Carone e a República em Capítulos, os organizadores apresentaram o conteúdo e o processo de produção, comentaram seus próprios textos — presentes na apresentação e introdução — e ressaltaram a importância do acervo do Centro de Estudos para a historiografia brasileira. O evento contou com a presença de autores dos capítulos, do diretor do Museu Paulista da USP, Paulo César Garcez Marins, do supervisor técnico-científico do Museu Republicano, Francisco de Carvalho Dias de Andrade, além de professores, estudantes, pesquisadores e interessados em história.

Formação do acervo biblioteconômico

O núcleo inicial do acervo biblioteconômico do Museu Republicano foi a Biblioteca Prudente de Moraes, doada em 1925 pelos descendentes do primeiro presidente civil do Brasil, juntamente com mobiliário, objetos, iconografia e documentos pessoais. Em 2002, essa coleção passou a integrar o Dedalus — banco de dados bibliográficos da USP — e, no mesmo ano, foi lançado o primeiro volume dos Catálogos do Gabinete de Trabalho de Prudente de Moraes, iniciativa das comemorações do centenário de sua morte. Patrocinado por Olavo Setúbal, o catálogo lista títulos de livros e periódicos da biblioteca, acompanhados de paratextos e notas biográficas de grande parte dos autores. Sua elaboração contou com a atuação das bibliotecárias Maria Cristina Monteiro Tasca, Márcia Mendo e Rosemarie Horch, além da historiadora Raquel Glezer (TASCA, M. C. M.; MENDO, M. M. C.; GLEZER, R.; HORCH, R. E. Catálogo do Gabinete de Trabalho de Prudente de Moraes – Biblioteca, v.1. São Paulo: Polo, 2003).

O acervo começou a ser explorado por pesquisadores universitários na década de 1970. Para atender à crescente demanda, no final dos anos 1980 a equipe do Museu Republicano iniciou o projeto de formação de uma biblioteca de apoio às pesquisas. O projeto ganhou força com a transferência para Itu de duplicatas e descartes da Biblioteca do Museu Paulista, sob supervisão da bibliotecária Márcia Mendo, com apoio de sua equipe e de Roberto Miguel Damús, Assistente Técnico de Direção. Somaram-se a isso inúmeras doações.

Diante da grande quantidade dos livros reunidos, surgiu o desafio da sua organização. Maria Cristina Monteiro se voluntariou para a tarefa, graduou-se em biblioteconomia e tornou-se mestre na área. Apesar de enfrentar resistência institucional em certo momento, a situação mudou em junho de 1994, quando José Sebastião Witter assumiu a direção do Museu Paulista. Ele apoiou o projeto, autorizou a aquisição de equipamentos e criou o cargo de bibliotecária para o Museu Republicano. Aprovada em concurso, Maria Cristina assumiu o cargo e deu continuidade à organização da biblioteca de apoio.

Biblioteca Edgard Carone

No mesmo ano do lançamento do catálogo da coleção Prudente de Moraes, já estavam em curso as negociações para aquisição da Biblioteca Edgard Carone. A ideia surgiu em 1997, durante visita do professor Witter, acompanhado do historiador José Ênio Casalecchi, professor da Unesp. Em 1998, Witter levou Carone a Itu para conhecer a biblioteca do Museu Republicano, então em plena operação.

Carone faleceu em 2003, mas os contatos com sua família foram retomados pela nova diretora do Museu Paulista, Raquel Glezer. Com a intermediação de Maria Alice Setúbal, filha de Olavo Setúbal, Glezer sensibilizou o banqueiro, que já havia patrocinado o catálogo da coleção Prudente de Moraes. Com o consentimento da família, Setúbal adquiriu a biblioteca de Carone e a doou à USP.
A incorporação da Biblioteca Carone ao acervo do Museu Republicano exigia um edifício para a sua instalação. O servidor Ronaldo Mendonça, com apoio dos jornalistas José Carlos Arruda e Malú Garcia, buscou soluções. A resposta veio do prefeito Herculano Castilho Passos Junior (PV) e de Álvaro Stella, Secretário de Cultura, que ofereceram, em regime de comodato, o edifício conhecido como “Casa do Barão”, próximo ao Museu Republicano.

Em dezembro de 2003 a professora Eni Mesquita assumiu a direção do Museu Paulista e prosseguiu nas negociações com o poder público municipal. A minuta do contrato foi elaborada pelo professor Dirceu Sonsin. Finalmente, em 12 de agosto de 2005, o prefeito sancionou a Lei Municipal nº 655, autorizando o contrato de comodato com a USP. O reitor José Adolfo Melfi aprovou as obras de adaptação do edifício, concluídas em tempo recorde sob o comando do Coordenador do Espaço Físico da USP, Antonio Marcos Massola.

Nesse espaço renovado, em 31 de novembro de 2005 inaugurou-se o Centro de Estudos do Museu Republicano, destacando-se nele a Biblioteca Edgard Carone. A transferência da biblioteca, antes instalada em São Paulo, envolveu as equipes das bibliotecas do Museu Paulista, chefiada por Márcia Mendo, e do Museu Republicano, chefiada por Maria Cristina. A equipe do Museu Paulista embalou as obras para transporte, enquanto em Itu ambas organizaram a coleção em estantes deslizantes confeccionadas especialmente para o Centro de Estudos. A organização biblioteconômica do acervo foi concluída pela equipe da Biblioteca do MRCI, coordenada por Maria Cristina, e rapidamente disponibilizada aos consulentes.

Texto: Jonas Soares de Souza
Fotos: Tucano

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